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Mike Dudley: “As músicas dos The Sound ainda dizem muito às pessoas”

Mike Dudley: “As músicas dos The Sound ainda dizem muito às pessoas”

by Pedro Vasco Oliveira

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The Sound é, seguramente, uma das bandas mais icónicas e apreciadas dos tempos do pós-punk e new wave, florescente nos idos anos 80 do século passado e que, no momento presente, ganha novo fôlego e uma espécie de nova vida.

São muitas as bandas que fizeram furor e sucesso nessa época e que agora, mais de três décadas volvidas, voltam a preencher o imaginário sonoro dos jovens daquele tempo, mas também dos de agora.

Isso mesmo foi confirmado, a este vosso devoto escriba, por Mike Dudley, baterista fundador dos The Sound e interlocutor desta conversa aquando da passagem dos In2TheSound, banda tributo aos autores de «Missiles», «Skeletons», «Winter» e tantos outros hinos do pós-punk e new wave: “Até agora, a maior parte das pessoas com quem tenho falado a seguir aos concertos ainda nem sequer era nascida quando a banda existia”.

 

Para o ex-colega de Adrian Borland, “as músicas dos The Sound ainda dizem muito às pessoas”.

Aproveitando a passagem de Mike Dudley e dos In2TheSound pelo Porto (Hard Club), conversámos com o baterista fundador dos The Sound sobre o surgimento deste tributo e ainda sobre os tempos de actividade da banda londrina.

Depois de cerca de 30 anos afastado dos palcos e da vida artístico-musical, Mike Dudley assumiu a bateria dos In2TheSound que, aproveitando a deixa da exibição do documentário «Walking In The Opposite Direction», do realizador Marc Waltman, levam a palco alguns dos mais celebrados temas dos The Sound.

Mundo de Músicas – Porquê o regresso agora?


Mike Dudley – E por que não?… Sabes, reformei-me há uns anos e fui viver para o sul de Espanha e apercebi-me, através do Facebook, que o Carlo [van Putten], o vocalista dos In2TheSound, andava a suportar a exibição do filme actuando a solo, interpretando algumas canções só com uma guitarra, e, em jeito de brincadeira, entrei em contacto com ele através de mensagem: “Olá Carlo, não precisas de um baterista?”. E ele respondeu-me simplesmente: “Ok”… Eu estava empenhado em fazê-lo e havia ainda os outros músicos dos The Convent e, então, posso dizer que esta é a segunda parte da minha carreira como músico.

Com o lançamento de toda a discografia dos The Sound a estreia do documentário e a digressão chegou, finalmente, o reconhecimento que a banda merece e que em outros tempos não teve?

Bem, até agora, a maior parte das pessoas com quem tenho falado a seguir aos concertos ainda nem sequer era nascido quando a banda existia. Assim, todo este novo interesse pela música dos The Sound surge muito pela Internet e também, em especial na Alemanha e na Holanda, há uma espécie de ressurgimento do pós-punk e da new wave, com gente como o Peter Hook, The Chameleons ou Echo & The Bunnymen de volta e em força, e, entretanto, demo-nos a fazer parte disso também.

A fazer parte disso… mais uma vez?

Sim, é uma espécie de Parte 2.

Isso é também uma expressão da actualidade e da contemporaneidade da música dos The Sound?

Sim, a música perdura, sem dúvida, e como soa é algo que podia ter sido gravado originalmente hoje, porque tem substância, não é, sei lá, as Bananarama ou algo assim. Tem ideias e é algo em que, musical e liricamente, podemos morder e, por isso, consegue perdurar no tempo.

A música dos The Sound é fruto da alma atormentada de um génio a que se juntaram três músicos para dar corpo a essa genialidade?

Bem, as ideias para as músicas e as letras eram todas do Adrian, que as trazia para a banda e nós transformávamos em canções. Agora, as canções eram todas sobre o Adrian e o que se passava na cabeça dele, era sempre essa a sua situação que ele cantava.

E ainda o «outro» que o perseguia, digamos?

Exactamente, o «outro» que andava dentro da cabeça dele… Esse «outro» é que era o verdadeiro problema! No ano passado fui a um evento na Holanda, onde estava o produtor do filme Jean Paul Van Mierlo, e no final da projecção de «Walking In The Opposite Direction», estive à conversa com ele que me disse, a propósito de dois quadros que lá havia, serem um do Adrian e outro feito pelo próprio Adrian, que também era muito dotado para as artes plásticas, e que era um auto-retrato. Porém, esse auto-retrato não se parecia em nada com o Adrian, mas mais parecia um ‘monstro demoníaco’. E penso que aquilo é o retrato do problema que o Adrian tinha e desse «outro» que o atormentava.

E como era trabalhar com o Adrian Borland? Era fácil ou complicado devido a esses problemas?

   

Era difícil, porque quando o problema estava no auge ele era muito autoritário em relação à maneira como queria as coisas, pelo que não havia muito a fazer a não ser deixar andar. Ele era, de facto, uma pessoa difícil de trabalhar com, mas a riqueza do material e das ideias que ele propunha chegavam para pôr isso tudo de lado.

E The Sound era, acima de tudo, uma banda de palco ou de estúdio?

De palco, sem dúvida, porque ao vivo é sempre tudo mais excitante. Nós gostávamos de estar em estúdio, mas éramos mais felizes quando tocávamos ao vivo.

O que sentes mais falta dos tempos áureos dos The Sound e dos anos 80?

De estar em digressão. Sempre gostei muito de andar em digressão.

Depois dos The Sound a vida foi aborrecida e monótona fora dos palcos?

Sim, e durante muito tempo, uma vez que arranjei um trabalho normal e desisti de tentar ser uma estrela na música. Trabalhei 20 anos numa empresa e depois mudei para outra, mas foram sempre trabalhos chatos comparados com a música. Eu reformei-me em 2016, porque já estou com 67 anos e porque tive um acidente em que me magoei nas costas, parti três vértebras. Entretanto, um amigo meu que vive em Espanha queria vender uma propriedade que lá tinha e eu fiquei com ela. E assim deixei a chuvosa, chata, fria e fodida Inglaterra e fui para a soalheira e quente Espanha, onde sou bastante feliz. E o ter voltado agora às lides da música deixa-me ainda mais feliz.

Bem, neste momento és o porta-voz dos The Sound e uma espécie de garantia de qualidade dos In2TheSound, uma vez que és o único dos fundadores da banda original presente no tributo?

Sim e é uma experiência nova para mim. Quando, hoje, falo com muita gente sobre os The Sound são sempre conversas muito emotivas, porque as músicas dizem muito às pessoas. Porém, nos anos 80 essas conversas eram todas com o Adrian, nós raramente participávamos. E ele até gostava, porque aquilo era tudo o mundo dele. Agora é diferente, porque vem tudo ter comigo e tenho que ter muito cuidado com o que digo, porque não quero ferir susceptibilidades, pois por vezes posso ser muito seco. E isto é tudo novo para mim, por isso, tento ser o mais empático possível e responder a todas as perguntas das pessoas.

Numa entrevista disseste que os teus álbuns preferidos são «Thunder Up» (1987) e «Propaganda (1999), curiosamente, os dois últimos dos The Sound. Porquê?

Quando o «Propaganda» saiu e o ouvi tinham passado muitos anos sobre a altura em que gravámos e fiquei surpreendido com a frescura que ele tinha. Gostei muito da frescura e do brilho do álbum. Por exemplo, se olharmos para «Jeopardy» vê-se nele o estúdio e o cuidado em torno dele, apesar de ser um bom álbum. Já o «Thunder Up», é um álbum de que gosto porque, apesar de capturar muitos momentos de partilha entre o grupo e ter muitos momentos rock, é um disco mais melancólico, o que era algo novo para nós.

Vocês estiveram em Lisboa em 1984 e essa passagem ficou perpetuada no tema «Barria Alta», no álbum «Thunder Up»…

«Barria Alta» é uma má pronunciação do nome Bairro Alto, em Lisboa. Essa música surge porque o Adrian estava muito entusiasmado em ir conhecer a zona dos bares, era muito a cena dele. E ele usou a imagem das luzes à porta dos bares como metáfora para um estado de espírito em ascensão. Só depois, já em Inglaterra, quando escreveu a canção é que tentou, connosco, saber como se chamava a zona e… acabou por ficar «Barria Alta».

O que podes dizer aos meus devotos leitores que nunca tenhas dito numa entrevista acerca dos The Sound?

Bem, tu procuras um segredo?… Ora, a Benita [«Bi» Marshall, teclista e saxofonista fundadora da banda] deixou os The Sound e acusou-nos de a termos mandado embora, mas ela foi apenas convidada a sair por não contribuir absolutamente nada para a criação da banda. Ela dirá que nós somos todos horríveis e maus e que por isso foi mandada embora, mas, na verdade, ela foi, sim, intensamente convidada a sair porque não fazia nada que ajudasse a criar material novo.

O visionamento do filme «Walking In The Opposite Direction» permite confirmar a defesa de Bi Marshall, mas dá também a oportunidade ao espectador de conhecer um pouco melhor a vivência da alma atormentada e a criatividade genial de Adrian Borland, seja no tempo dos The Sound, seja nos anos que se seguiram até ao seu suicido em 1999, durante os quais nunca deixou de criar e de formar projectos musicais.

Foi num desses projectos que conheceu Carlo van Putten, vocalista dos In2TheSound e que foi desde a primeira hora um entusiasta desta (espécie) de homenagem ao talento de Adrian Borland.

Os In2TheSound são: Mike Dudley (bateria), Carlo van Putten (voz), JoJo Brandt (guitarra), Carsten Lienke (baixo) e Michael von Hehl (teclados).

Sobre a passagem dos In2TheSound pela cidade Invicta, em Janeiro último, pode ficar a saber tudo AQUI.

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