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Diamanda Galás: a bruxa má entre gritos e gargalhadas nos bastidores

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Diamanda Galás: a bruxa má entre gritos e gargalhadas nos bastidores

by José Manuel Simões

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Diamanda Galás, a feiticeira do cântico negro, a voz demoníaca do firmamento musical, recebeu-me ao telefone. O que era para ser uma entrevista de meia hora acabou em genuíno delírio e sombria obsessão pela morte. “Quando os deuses chegarem ao meu leito de morte vou-me rir na cara deles”, proferiu, sem medo ou hipocrisia. A tal face descoberta – ou coberta com sangue – as palavras fazendo lembrar rituais de auto-imulação ou missas negras em louvor de Satanás.

Estava estupefacto com aquela sede assombrosa em dissecar os caminhos mais tortuosos da mente. Afiança que quando pensa em diabo, “penso nos parasitas norte-americanos que criaram a SIDA e o ANTRAX em laboratório. Mais tarde ou mais cedo esses filhos da puta vão ter que pagar por isso”. E avisava: “os políticos norte-americanos que se habituaram a lidar com as pessoas como se fossem cães, arrepender-se-ão. Andam a tratar o resto do Mundo como merda mas em breve vão-se foder todos”.

A artista estava alterada, mudava de idioma, passava do espanhol para o francês, algo que soou a grego, remate em inglês: “O meu canto não é só raiva destilada. É um grito”. E o discurso inflamado de vez: “Demónio? Demónio? Demónios são os cobardes e os medrosos. Aviso já que tenho sede de vingança e de morte”. A catarse chega a ser chocante.

Dias depois Diamanda actuou no Hard Club, em Gaia. Findo o arrepiante espectáculo saiu de cena sem encore nem adeus. O gerente veio prevenir-me que a cantora queria falar comigo. E avisava: “vai devagar que ela está pior que uma fera”. Enquanto descia as escadas já a ouvia gritar. Viu-me mas não se conteve: “Convidaram-me para tocar numa espelunca destas, quem é que estão a pensar que eu sou? Eu não toco em clubes para bêbados e drogados! Juro que ainda fodo alguém…” gritava, agora na minha direcção.

Aquela figura toda de preto, magra e cara de má, deu-me uma vontade louca de rir. Não resisti e expeli abundante gargalhada. Diamanda Galás conteve-se: “Este gajo é fixe! Foste tu que escreveste o texto onde me chamavas “bruxa má”?

   

Que sim, que tinha sido eu, ela desalmada, “bruxa má”, “bruxa má”. O riso contagiou ainda a empresária, os três a rir que nem perdidos. Perguntou-me se tinha todos os seus discos, autografou-os um a um, abraçou-me, rendida. “Está habituada a chocar as pessoas e desta vez ficou desarmada”, segredou a empresária quando a artista foi à casa de banho.

Diamanda Galás retorna, olha-me nos olhos, sorri e expõe: “logo agora que o que mais queria era matar o meu ex-namorado e arrastar o seu cadáver pela lama é que me apareces tu para me fazer rir”.

E, entre gargalhadas, repete, aprazida: “bruxa má, bruxa má, bruxa má”.


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