Roadies. O termo deriva do inglês, combinando “road”, que significa estrada, com “ie”, um sufixo usado para criar diminutivos. Se quiséssemos traduzir o termo para a língua portuguesa, a palavra “estradinha” poderia muito bem ser utilizada. Mas isso, na nossa opinião, descaracteriza totalmente aquilo que é um “roadie” ou o estilo de vida que representa.
Mas o que é um roadie, afinal? Alguns de vocês talvez já estejam a sorrir ao reconhecerem o termo. Um roadie é alguém que está sempre na estrada. O termo tanto se pode aplicar às bandas, quando andam de um lado para o outro nas suas digressões, como a pessoas específicas com uma grande responsabilidade: executar tarefas relacionadas com produção dos espetáculos, de forma a assegurar que está tudo em ordem para o momento em que a banda subir ao palco.
É por isso mais do que natural que ao longo da história da música tenham sido várias as bandas a falar das suas experiências enquanto roadies ou dos roadies que encontraram pelo caminho. Neste post, sacudimos o pó dos nossos discos de rock n’ roll e procuramos músicas que nos falem da vida das bandas e de episódios que viveram quando saíram para a estrada.
Na música Dirty Frank, incluída como música bónus na edição europeia do álbum Ten dos Pearl Jam, a banda canta-nos sobre um tal de Dirty Frank, o condutor da camioneta que os conduziu de cidade em cidade na tour que fizeram ao lado dos Red Hot Chilli Peppers, entre 1991 e 1993. Em várias entrevistas dadas pela banda, os Pearl Jam relembram que o Dirty Frank era ligeiramente estranho: sempre que regressavam à camioneta, vindos de um concerto, reparavam que havia imensas latas de cerveja vazias debaixo do banco do condutor. Levada pela imaginação, a banda de Eddie Vedder chegou mesmo a formular teorias de que o homem era um serial killer e que comia as suas vítimas.
A música Truckin’ é uma das mais conhecidas da banda Grateful Dead e um verdadeiro hino ao tempo que passaram na estrada. Reunidos para compor a música, os membros da banda concentram na letra várias das experiências por que passaram ao longo das suas tours, quando estavam completamente pedrados e sob o efeito de drogas. Os Grateful Death lançam ainda algumas luzes sobre o lado mais negativo das tours: o facto de se cansarem de andar de um lado para o outro e o desejo de, eventualmente, quererem assentar com as suas vidas. Uma música não tanto sobre o trabalho de roadie mas sim sobre a vida na estrada. Pode ser encontrada no álbum American Beauty.
A música Turn The Page é sobre a viagem emocional e social marcada por altos e baixos da vida musical de Bob Seger. Vários produtores e amigos do artista contam que a música foi composta durante uma das paragens que a sua caravana fez, quando iam de cidade em cidade. A letra foca-se em episódio específicos pelo qual o artista passou, como a admiração das pessoas ao ver o cabelo do artista e em perguntarem se se tratava de um homem ou de mulher. “Is it woman, is it man?” é de facto um dos versos da emblemática Turn the Page. Em 2006, durante um concerto em Winscosin, Bob Seger confessou perante a audiência: “Escrevi esta música em 1972, num quarto de hotel em Eau Claire, no Wisconsin”. Turn The Page faz parte do álbum Back in ’72.
Paul Simon compôs Homeward Bound numa estação de comboios, durante os anos em que experimentou a sua sorte em Inglaterra e tocava ocasionalmente em bares e cafés. Com reminiscências de melancolia mas um tom que não é zangado, Paul Simon canta-nos sobre o mundo do espetáculo e um dos problemas das tours: o facto de repetirem, noite após noites, as mesmas músicas: “Tonight I’ll sing my songs again / I’ll play the game and pretend.” O êxito está incluído no álbum Parsley, Sage, Rosemary and Thyme.
Nesta música dos Creedence Clearwater Revival, a banda de John Forgerty imagina-se a si mesmo como um mero artista, no meio do nada, a fazer música em troco de esmolas. O significado da música reflete, no entanto, o esgotamento sentido pelas longas viagens de estrada levadas a cabo pela banda. Como que desprovida de ambição, tudo o que a banda quer é regressar a casa. Lodi, uma localidade na Califórnia, é escolhida como a cidade onde a banda canta “Oh Lord, stuck in Lodi again” (“Oh Deus, presos em Lodi outra vez”). Curiosamente, a banda nunca passou por esta cidade. A escolha recaiu apenas na sonoridade da palavra. A música faz parte da tracklist do álbum Green River.
Lemmy Kilmister prestou o seu tributo às tours feitas pelos Motörhead escrevendo esta emblemática música… na casa de banho. De acordo com o guitarrista dos Motörhead, este era o único espaço do estúdio onde podia, de facto, ter alguma privacidade e sossego. A música fala-nos das muitas responsabilidades de um roadie, aqui surgindo como a pessoa a quem cabe preparar tudo para o espectáculo. Os versos que se seguem demonstram bem o peso destas responsabilidades: “Another backstage pass for you / Another tube of super glue / Another border to get through”. A música pode ser encontrada no álbum Ace of Spades.
O guitarrista dos Mott The Hoople, Mick Ralphs, defrontou-se com um grave problema durante uma tour: perdeu a sua guitarra. O episódio inspirou então a música All The Way from Memphis. Nesta canção, incluída no álbum Mott, seguimos a história de um rock n’ roller que vê a sua guitarra ser enviada para Baltimore em vez de Memphis, onde daria o concerto. O artista, que só percebe a meio da viagem que não tem a sua guitarra consigo, demora um mês a descobrir onde está o instrumento. A música reflete o cansaço provocado pelo estilo de vida rock n’ roll.
Composto por Mick Jagger e Keith Richards, o êxito Torn and Frayed fala-nos dos parasitas que estão sempre atrás dos artistas durante as tours: prostitutas, doenças e drogas. Com descrições dos bastidores dos concertos dos Rolling Stones nos anos 70, somos levados a um mundo de exageros e até mesmo uma certa decadência. Ainda assim, esta não é uma música que se deixe levar pelo lado mais sujo das tours porque, como encontramos na letra, há sempre espaço para salvação: “Just as long as the guitar plays / Let it steal your heart away.” Este êxito da banda britânica pode ser encontrado no álbum Exile On Main Street.
Nesta música, Chrissie Hynde compara os tours á guerra – uma perspetiva que é, na verdade, comum em vários álbuns de bandas da época dos The Pretenderes. Em Day After Day, Hynde canta sobre aviões e golfinhos em Tóquio e Lake Erie, voando sobre tudo enquanto perdem a vida real que está a acontecer à superfície. Na música, Chrissie Hynde chega mesmo a sussurrar de forma intimista os versos: “When the war’s finally over we’ll meet again / And pick up where we left off.” Logo depois, a guitarra de James Honeyman-Scott toma a liderança e ouvimos o som de um avião a despenhar-se. A música pode ser ouvida no álbum Pretenders II.
Um crítico disse uma vez que o álbum Running on Empty, de Jackson Browne, era sobre a vida na estrada, no palco, nos bastidores e em quartos de hotel. Composto em conjunto com Bryan Garofalo, este êxito de Jackson Browne descreve os pontos altos e baixos da vida na estrada, assim como a gratidão e frustração simultânea do artista pela experiência que está a viver. Entre os versos mais tocantes, encontramos “We’ve got time to think of the ones we love / While the miles roll away” embora isto se assuma como uma contradição porque “The only time that seems too short / Is the time that we get to play.”