Eu gostei tanto, tanto, quando me contaram quem foi Lupicínio Rodrigues

Há alguns anos estava assistindo a um programa de televisão em que uma cantora conversava animadamente com a apresentadora. Era Elza Soares na presença de Fátima Bernardes: as duas estavam se entendendo muito bem. Prestando atenção na veterana de voz potente, me senti musicalmente pobre quando ela relatou/desabafou: “tem jovens que não conhecem Lupicínio! Isso não pode!”.

Um jovem como eu, que me considerava conhecedor de boa música por conhecer cantores espetaculares como Nelson Gonçalves, Altemar Dutra, Silvio Caldas, Cauby Peixoto e Agnaldo Rayol, me senti envergonhado, pois eu não conhecia aquele “cara”. Quem era esse Lupicínio? – me perguntei. Fui imediatamente para a internet e fiz uma simples pesquisa. Ali eu percebi que me faltava conhecer um dos maiores compositores do Brasil, um cara que falava de dramas e sofrimentos populares, de forma direta e sem meias palavras. Ali eu vi que eu teria que conhecê-lo melhor e, posteriormente, me tornar um fã.

Ao ler sua história fiquei admirado pela sua forte personalidade, a qual é atribuída a autoria da expressão “dor de cotovelo. Ela é bastante usada para descrever a dor de quem sofre por amor naquele tempo, em que quase todos os homens sofriam sobre o balcão de um botequim e que, de tanto afogarem as mágoas nos copos de bar, acabavam sentindo dores em seus cotovelos. Imediatas foram as indagações: como um jovem pode deixar de prestar atenção em homens como Lupicínio? Como a nossa geração pode esquecer da sua própria história artística e cultural?

Há quase um ano, adquiri um dvd em que Adriana Calcanhoto interpreta as músicas do poeta de Porto Alegre. Ela é acompanhada de grandes músicos e de um público que vive a música de Lupicínio. O trabalho se chama “Loucura”, digníssimo a quem desejar conhecer a obra do músico – os maiores clássicos estão todos lá! De voz suave e ótima dicção, a artista consegue imprimir um drama nunca antes alcançado em “Volta”, canção que recebe um guitarrista que embala com maestria um blues que a ajuda na encenação: ela acende um cigarro e termina o “ato” cantando deitada no chão do teatro da Universidade Federal do Rio Grande do Sul: “volta, vem viver outra vez ao meu lado. Não consigo dormir sem teu braço, pois meu corpo está acostumado”. Brilhante!

Outro intérprete fiel a Lupicínio era o sambista Jamelão. O intérprete de sambas-enredo da Estação Primeira de Mangueira dedicou discos inteiros ao compositor, que foi o mais presente em seu vasto repertório. De todas as interpretações, a mais tocante é “Ela disse-me assim”, que ganhou uma levada de samba-canção e também já se destacou em uma regravação sob o ritmo de bolero. “Vingança” também ficou lindíssima na simplicidade marcante do cantor. A voz potente de Jamelão alonga as notas em “enquanto houver força em meu peito eu não quero mais nada… Só vingança, vingança, vingança! Aos santos clamar!”. Espetacular!

Há poucos meses atrás, Elza Soares, quem me revelou o trabalho de Lupicínio, gravou um dvd e cd ao vivo em que ela diz que “canta e chora Lupi”. Lupi é a forma carinhosa pela qual ela continua a chamar o seu amigo, falecido em Agosto de 1974, há quarenta e dois anos. O show se inicia com a cantora cantando “Exemplo” à capela: “este é o exemplo que damos aos jovens recém-namorados. Que é melhor brigar juntos do que chorar separados”. Logo em seguida vem uma série de sucessos, dentre eles a mais famosa de Lupicínio em sua voz “Cadeira Vazia”, música regravada por vários artistas de peso, mas fielmente por ela cantada e chorada! As interpretações justificam o título do álbum!

Após conhecer o autor destes clássicos da Música Brasileira, posso dizer com um de seus versos que “eu gostei tanto, tanto, quando me contaram” quem foi/quem é Lupicínio Rodrigues. Muito obrigado, Elza Soares!

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