Há uns tempos fui a Braga entrevistar acompanhado pela manita Mirabelle – meia francesa e não conhecia os – que se revelou de imediato seduzida com o som e as letras da banda de culto mais antiga da música portuguesa. E disse: “Se na minha adolescência eu também tivesse gritado «quero morder-te as mãos», ao longo dos anos provavelmente não teria mordido tantos desgraçados”.
Lá no cimo, no Bom Jesus, o cantor foi tirar umas fotos na casa-de-banho e quando voltou não me surpreenderam os antagonismos entre Luxúria Canibal, o vocalista, e Morais Macedo, o jurista. O que me apanhou desprevenido foi a forma como atacou, sem rodeios, a Igreja e a terra em que vive, “onde há uma maledicência generalizada e uma entediante pasmaceira”, e o facto de nunca ter votado porque não se revê representado por outrem, “seja ele quem for”.
Todavia, o que me avocou foi a forma como se referiu à morte como sendo “extraordinariamente atrativa, algo que nos enamora e nos alicia constantemente”. Referia-se às dores da alma, “as dores que fazem com que haja tantos suicídios entre os adolescentes”.
E tu, Adolfo, já pensaste em te suicidar?
“Pensei, é evidente. Até um dia em que, depois da ideia de suicídio ser em mim recorrente, perceber que a morte estava sempre à mão. Se a coisa corresse mal cometia o ato”. E como? “Para mim está sempre associado à pistola”. É este abraçar ilimitado de possibilidades, com derrapagens, fios da navalha e tudo o que isso tem de excitante e dramático, que fascina os que não desistem da fuga à normalidade.